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HISTÓRIA

A corrida de rua é a modalidade esportiva que mais se desenvolveu nas principais cidades do mundo. No Brasil, tomou impulso a partir da década de 1990 e se consolidou, nos últimos anos, como prática cultural urbana que mais tem evoluído em número de participantes. Ao se estabelecer como manifestação cultural da cidade contemporânea, a corrida possibilitou uma nova dinâmica para a função social da rua como meio propício à interação entre desconhecidos. Podemos dizer que é uma experiência urbana favorável à sociabilidade.

BREVE HISTÓRICO

A corrida de rua é um fenômeno urbano que se inicia a partir dos anos 1970, nos Estados Unidos, principalmente com o advento do jogging, e consolida-se nesse início de século, no Brasil, como prática cultural urbana que mais tem se desenvolvido nesse início de século. O grande número de adeptos e de eventos organizados dessa modalidade esportiva aponta para o fato de que, entrementes às pesquisas de caráter biológico ou de rendimento atlético, pouco se diz na área das ciências humanas sobre o tema.

A CORRIDA DE RUA E A SOCIABILIDADE

A corrida de rua, modalidade esportiva também conhecida como pedestrianismo, é uma prática cultural que mais tem se desenvolvido nos principais centros urbanos do mundo. Originada na Inglaterra do século XVIII, obteve popularidade principalmente após maratona1 realizada nos primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna, em Atenas, 1896. Considerado como o mais comum e praticado dos exercícios físicos, a corrida está associada à promoção de um estado de euforia em seus praticantes e ao prazer em competir e vencer (NEWSHOLME, 2006).

É a partir da década de 1970, nos Estados Unidos, principalmente com o advento do jogging e a contribuição decisiva do Dr. Kenneth Cooper2 que o desenvolvimento da modalidade alcançou índices surpreendentes e a sua expansão ocorreu na direção de vários países. No Brasil, tomou impulso a partir de meados da década de 1990 e se consolidou, definitivamente, nos últimos dez anos, com modalidade esportiva e prática cultural urbana que mais tem evoluído em número de participantes.

O sucesso da corrida de rua e o lugar de destaque que ocupa dentre as práticas culturais urbanas na atualidade são decorrentes de diversos fatores, que tanto podem ter como causa a sua popularização ou a sua elitização. Pode tratar-se de algo objetivado, um produto das invenções históricas gerados pelas metamorfoses culturais dos gostos, que promove a paixão súbita pelo reencontro fantástico entre uma espera e a sua realização (BOURDIEU, 1983), como uma oferta irrecusável que preenche a lacuna de uma possível associação entre vida saudável e competitividade.

A busca pela qualidade de vida talvez seja o maior atrativo oferecido pela corrida de rua atualmente. Isso porque correr na rua não é apenas exercício físico. Trata-se, antes de tudo, do ser humano em ação, o que compreende a relação entre corpo e movimento no contexto sociocultural. É por razões diversas que ela integra a agenda de pessoas de várias idades, de ambos os sexos, de padrões econômicos, socioculturais e profissões distintas, seja por questões relacionadas à saúde, à estética, ao lazer ou ao desempenho esportivo.

Mas, afinal, por que as pessoas correm? Por que a corrida de rua exerce tanta influência no cotidiano das pessoas? Como manifestação cultural tipicamente urbana, a corrida de rua não se tornou um atrativo para a sociedade moderna apenas e unicamente por ser transformada em valor mercadológico pelo capital e seus vínculos com a mídia. Muito mais do que isso trata-se de uma atividade livre, incerta, improdutiva e fictícia que, apesar de delimitada e regulamentada, proporciona a fuga da realidade. Trata-se, portanto, de um jogo, um algo lúdico que encanta, persuade e arrebata (CAILLOIS, 1990).

Esse jogo, proporcionado pela interação corredor-rua, exercita a subjetividade humana, pois para se jogar não é necessário outro jogador/corredor, mas algo que responda de contra-golpe às tentativas do jogador em superar o desafio. Isso é o jogo, que permite a quem joga a opção do decidir-se por isto ou aquilo na circunstância tal ou qual, e de jogar apenas seriamente com possibilidades reais e que são proporcionadas pela liberdade inapelável e restrita do risco da escolha (GADAMER, 1999).

No contexto do lúdico que arrebata ela é capaz de mobilizar forças extraordinárias da capacidade humana para a realização de um desejo que não se satisfaz nunca – o desafio da superação, o irracional e o instintivo que prevalece; a corrida de rua está para além do bom senso. Como exemplo dessa corrida-jogo, veja-se o caso do corredor que se depara com condições adversas (clima, relevo), e que se apresentam como contragolpes às suas tentativas de superação: ele terá que decidir por si só o que fazer, como fazer e quando fazer, disso dependerá o seu triunfo ou revés.

Ao se estabelecer como manifestação cultural da cidade contemporânea, a corrida possibilitou uma nova dinâmica para a função social da rua – um lugar não apenas de trabalho, comércio e que serve apenas para o incessante fluxo de veículos motorizados ou o local do desencontro de um amontoado de seres humanos, porém, como meio propício à sociabilidade3. A interação entre os indivíduos na busca de determinadas finalidades é o que define a sociabilidade. Deste modo, o indivíduo, ao correr pelas ruas da cidade, recria o espaço urbano e amplia as suas possibilidades de usos e costumes, onde a rua se apresenta como palco e cenário da busca de um mundo melhor – a esperança da melhor qualidade de vida, da aventura e da realização pessoal.

A rua, portanto, é o espaço público onde transcorrem as relações sociais entre os corredores, o local onde eles vivenciam suas semelhanças e diferenças socioculturais. É o palco da expressão da sociabilidade entre os corredores, o termo comum para o cumprimento de tarefas semelhantes (completar o percurso da disputa), em meio a objetivos distintos (vitória, recorde pessoal, estética, lazer, saúde e qualidade de vida, etc.).

Como suporte de sociabilidade para os corredores, a rua adquire significados para além do senso comum. Ela se estabelece como o ponto de encontro entre desconhecidos e do reconhecimento de uma diversidade de usos e costumes proporcionados pela desigualdade social e cultural. É assim que a corrida, que tem a rua como palco e cenário de sua manifestação, possibilita aos corredores o fenômeno da sociabilidade urbana. Esta deve ser capaz de romper com as barreiras sociais, culturais e econômicas que, em outras situações do cotidiano, se erguem imponentes e intransponíveis entre os indivíduos. (MAGNANI, 1993).

É esta sociabilidade, onde os indivíduos compartilham ações no instante mesmo em que ocorrem e em condições semelhantes e que exige a percepção do outro enquanto um corpo que interage comigo no tempo-espaço de um ambiente comum em meio às diferenças individuais (BAUMAN, 2001), que proporciona elementos interessantes para a reflexão acerca da corrida de rua enquanto experiência urbana no contexto de uma prática cultural.

NOTAS

1. Evento competitivo tradicional, na distância de 42,195 km, que remonta à guerra entre gregos e persas. Diz a lenda, que o soldado grego Felidípedes correu aproximadamente 40 km pelo planalto de Maratona até Atenas, para dar a notícia da vitória dos gregos sobre os inimigos.

2. Médico norte-americano, entusiasta do exercício físico como fator de prevenção de doenças, com várias pesquisas realizadas, principalmente nas décadas de 1970-80, e inúmeras publicações sobre a tríade atividade física-saúde-corrida.

3. Contrapondo-se a idéia de Henry Lefebvre: Lugar de encontro? Talvez, mas quais encontros? Superficiais. Na rua, caminha-se lado a lado, não se encontra. É o “se” que prevalece. A rua não permite a constituição de um grupo. De um “sujeito”, mas se povoa de um amontoado de seres em busca. De quê? O mundo da mercadoria desenvolve-se na rua. (A vida cotidiana no mundo moderno, São Paulo: Editora Ática, 1991).

“É interessante refletirmos sobre essa modalidade esportiva aberta à participação popular que é a corrida de rua. O modo como ela acontece, as experiências que adquirimos, e os benefícios existentes para os praticantes”.

“Saúde e Bem Estar, é o que desejamos à todos!”

>Abraços!
Alberto Borges (Beto)

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